05 outubro 2010

LÚCIO FERREIRA UM REPUBLICANO DAS MÓS

Lúcio do Nascimento Ferreira teria nascido em 1880, na que foi uma ampla e antiga casa situada mesmo defronte da entrada da capela de Santo António. Ali cresceu no seio duma família remediada e extensa pois, para além dos pais, Manuel António Ferreira (“Ginja”) e Maria Henriqueta Melchior Lindo, era ainda constituída por 6 filhos e o avô Venâncio António Lindo, um ancião com “saberes” e boa memória, acrescidos de qualidades pedagógicas, que lhe permitiram complementar os ensinamentos ministrados pelo competentíssimo e sempre recordado professor José António Saraiva.
Desta preparação intelectual e cívica a que se juntaram as suas qualidades natas resultou que, feita a 4ª classe com distinção, fosse afastado dos afazeres ligados à lavoura e criação de gado, para enveredar pelo ofício de sapateiro, chegando a montar uma oficina, onde trabalhava por “conta própria”. E quando casou (em 17 de Setembro de 1903) já ele se tornara comerciante, dono de um “soto”, situado no centro da povoação, a poucos metros a norte da igreja matriz.
Quanto ao seu republicanismo bem cedo o tornaria público, pois logo em 1910 o seu nome figuraria como uma das 10 personalidades que constituíam a Comissão Paroquial Republicana das Mós, comissão que com as suas congéneres formavam a estrutura de base do Partido Democrático, oficialmente enraizado na designação tradicional de Partido Republicano Português (P.R.P.), um partido considerado do centro-esquerda.
A empenhada militância e lealdade que desde sempre dedicou ao P.R.P, fizeram dele um “dos mais proeminentes republicanos (na área do concelho de Foz Côa) …” (1)
Por outro lado, na sua terra natal sempre desempenhou com zelo e competência os cargos políticos para que fora nomeado. A comprová-lo, vejamos o que averiguou o meu amigo Dr. Joaquim Castelinho, que no topo do rol de “PERSONALIDADES DIGNAS DE REGISTO NO HISTORIAL DE MÓS DO DOURO”, escreveu:
“Lúcio do Nascimento Ferreira – Desempenhou com competência o cargo de Chefe” (?) “do Posto de Registo Civil nesta Freguesia, onde eram registados os nascimentos, casamentos, óbitos, pelo que muito beneficiaram” (também) “as Freguesias vizinhas de Santo Amaro, Murça e Seixas. Como Secretário da Junta de Freguesia e como Oficial do Registo Civil, foi louvado pelos bons serviços prestados, como consta na respectiva acta.” (2)
Depois de ter sido nomeado e desempenhado a função de Regedor, em 13 de Setembro de 1925 foi designado para substituir o sempre recordado professor José António Saraiva que se mantivera como Secretário da Junta desde 1895 até (ao ano do seu falecimento) 1925; ou seja, durante 30 anos. Assim, acabou por, ininterruptamente, servir a causa pública: durante os derradeiros 15 anos do regime monárquico e outros tantos anos após o advento da República.
E o seu sucessor, embora republicano “afonsista”, manteve-se no cargo de Secretário da Junta mesmo após o 28 de Maio de 1926, pois a 9 de Fevereiro de 1928, o respectivo Presidente, Francisco Mendes Júnior, atribuiu-lhe o encargo de inspeccionar os trabalhos efectuados na reparação das ruas, “por ser a pessoa mais indicada e competente para desempenho de tal missão, tendo recebido como prémio a gratificação de cem mil reis.” (3)
Pouco tempo depois passou a residir definitivamente na cidade do Porto, para melhor cuidar do futuro dos quatro filhos que tinha e, ao mesmo tempo, para dar largas à sua oposição ao salazarismo, passando a conspirar com correligionários, mormente conterrâneos, quase sempre em sítios mais ou menos esconsos, como o “Buraquinho”, uma casa de pasto situada na Praça dos Poveiros.
Esteve muitos anos sem visitar a sua terra natal, mas podia gabar-se de ter sido o primeiro mosense a escrever para que ficasse registado o nome das Mós numa enciclopédia, deixando também ali um outro artigo em que denunciava a injustiça que foi a alteração do nome da estação do caminho de ferro de Freixo-Mós para Freixo de Numão. (4)

(1) A Primeira República no Concelho de Vila Nova de Foz Côa, António N. Sá Coixão e António A. Rodrigues Trabulo, edição de C.M. de V. N. de Foz Côa, 1993, vide pág.69
(2) Monografia Histórica de Mós do Douro, Joaquim A. Castelinnho, 3ª edição do autor, 1982, vide pág. 220.
(3) Idem, idem, vide pág. 206.
(4) Idem, idem, vide pág.47 ou Diccionario Chorographico de Portugal Continental e Insular, Azurara – Vila do Conde, 1930, vide os topónimos AS MÓS e FREIXO DE MOZ.

Algés, 1 de Outubro de 2010

José Gomes Quadrado

Comments:
Bom dia Dr. José Gomes Quadrado.

Mas que texto tão bonito!
Adorei ler o que escreveu pela forma viva e lucida como decreve a vida deste homem, bem como a sua relevância para o povo das Mós - nosso sangue.
Essa história do nome da estação, foi algo que ouvia o meu pai falar (tantas e tantas vezes). E concordo que deveria chamar-se Freixo-Mós.
Um texto muito bonito pela informação histórica e pela forma tão genuina e clara como a descreve.
Muito obrigada.

Um forte abraço para si e esposa.
Maria Cristina Quartas
 
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