19 julho 2010

Carta para o Céu


Celeste:

Depois que te foste embora,
todos nós ficámos mais pobres.
E se a tua falta é, estreitamente, mais sentida pelos teus,
colectivamente, ela deixou em todos nós
um sentimento de orfandade.
Transfigurámo-nos, por ti, em órfãos culturais.

Do lugar onde subiste,
os anjos vieram dizer-nos
que ficaste admirada em não nos ouvires cantar
naqueles momentos que antecederam a tua ida.
Mas nós cantámos…
Cantámos “A laranjinha caiu, caiu...”
Só que, nessa hora,
a voz embargou-se-nos de tal maneira
que (por não ser tão forte como a tua)
não conseguimos fosse audível cá para fora.
Sabes como é,
faltou-nos peito e coragem.

Depois que te foste embora,
continuamos a rezar... muito... como tu gostavas...
embora não o saibamos fazer do mesmo jeito.
Do jeito como só tu conseguias rezar.
Consola-nos a esperança que as tuas preces,
porque feitas agora mais perto de Deus,
se façam ouvir ainda com mais força,
e possam favorecer este povo que amavas
com a graça dos santos que invocares.

Depois que te foste embora,
estamos tristes porque não sabemos as cantigas.
Estamos tristes porque, não tendo a tua força e a tua voz,
falta a líder do grupo “Cantares das Mós”.

Sabes, fala-se que este ano não vão fazer a Festa.
É verdade!...
Parece estar em risco a realização
da Festa a Nossa Senhora da Soledade.
E estamos tristes...
Estamos tristes porque se tu estivesses cá,
arranjarias certamente uns versos a propósito
e, com o teu entusiasmo, não deixarias que a Festa morresse.
Estamos tristes também por isso.

Escrevemos-te esta carta, porque queremos que saibas
quão grande é o nosso reconhecimento
por tudo o que fizeste nesta terra.
E mesmo que, por ser enorme a tua obra,
não te consigamos imitar,
queremos que saibas, também, que tudo faremos
para sermos dignos da grandeza da tua alma.

Recebe de nós muitas saudades
e recomenda-nos a todos.

Até um dia...
carlos pedro

Comments:
Um obrigado muito sentido para o autor desta magnifica carta. A minha querida tia Celeste estará certamente muito orgulhosa do reconhecimento que lhe é dispensado pelo seu empenho e amor que ao longo da sua vida dispensou às Mós e ao seu povo. Não era uma pessoa presunçosa, mas como qualquer mortal, gostava de ser reconhecida pelos seus feitos e valores. No último convívio na Mós, na visita obrigatória que lhe fiz já a encontrei um pouco fragilizada. Quando púnhamos a conversa em dia, a determinada altura disse-lhe que alguém deixou neste Blog uma referência elogiosa à forma impar (sabe-se lá se única) como rezou o terço no velório do Sr. Firmino. Respondeu-me: “Puseram isso na Internet?!” – ao mesmo tempo que deixava escapar um sorriso franco de admiração e de orgulho. Era assim a minha tia, altiva na sabedoria, humilde na sua maneira de estar, mas no seu intimo recompensada pelo valor e carinho que tantas e tantas vezes lhe foi dispensado pelas pessoas que com ela conviveram. Esteja ela onde estiver – que é no Céu com certeza – estará sempre com as Mós no coração e a pedir a bênção divina para as suas gentes.
 
Sr. Carlos Pedro,

Bem-Haja
Lurdes
 
Pode parecer uma expressão comum e gasta. Mas as Mós está efectivamente triste e monótona, pude comprovar isso mesmo esta semana. Paira no ar um sentimento de saudade e tristeza. Só quem conviveu de perto nestes últimos anos com a Sra. Celeste Castedo e sente pelas Mós algo que por vezes é difícil de explicar, pode sentir a falta desta Grande Mulher.
Mas,a juntar a esta perda, como será passar sem a "Festa das Mós"!!!
Aproveito para afirmar que, só um Grande Mosense e senhor de um talento enorme é capaz de transmitir o que O Carlos Pedro deixou expresso na sua mensagem.
Obrigado Carlos Pedro.
 
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