28 novembro 2011

Apresentação dos livros "A Caminho de Santa Bárbara" e "Trovador do Douro" em Lisboa


Apresentação dos livros A CAMINHO DE SANTA BÁRBARA
e TROVADOR DO DOURO 
Na CASA DE TRÁS-OS-MONTES E ALTO DOURO em Lisboa
Em 19 de Novembro de 2011

Exmos. Senhores
Presidente e restantes membros dos Corpos Sociais desta distintíssima Casa,
Senhor Presidente da Casa do Concelho de Foz Côa,
Minhas senhoras e meus senhores,

“A Caminho de Santa Bárbara”
A propósito dos temas desenvolvidos aqui pela co-autora Dr.ª Maria Cristina Quartas, telefonou-me há dias um mosense, comentando:
- Vê-se logo que as narrativas deste livro foram escritas por uma citadina!
- Porquê? – Perguntei eu.
- Porque confunde a vizinha aldeia de Murça com as Seixas e não só… Depois escreve com pormenor aspetos corriqueiros da vida que se levava nas Mós; dá demasiada importância a coisas tão insignificantes como são: os pirilampos, os gafanhotos, as ervas secas, as unhas-de-gato, o trovisco, as malvas, o rosmaninho…Quase tudo a que faz referência são coisas mesquinhas para quem se criou nas Mós ou em qualquer terra da nossa região.
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Ao escrever a narrativa “A Caminho de Santa Bárbara – 2ª Parte”, Cristina Quartas não teve a pretensão de apresentar um itinerário completo e rigoroso dos caminhos e das localidades que percorrera para chegar a Freixo de Numão e depois à aldeia de seu pai. O que mais nítido ficou na memória da retina foram: os bancos de pedra; as fontes de água fresca, límpida e leve; os lugares aprazíveis do caminho; as águas do Douro; o comboio a carvão que entrava num buraco (Túnel da Valeira e que chegava à Barca D´Alva). E ainda, os pombais que alvejavam nas encostas dos montes, as plantas silvestres, as cordilheiras de montanhas, o céu azul, os cheiros, os sabores… Depois, já quase no fim da viagem, refere que avistara, lá no alto, a capelinha de Santa Bárbara.
Com esta e outras descrições, longe de traçar itinerários, ao recordar estes e outros olhares de menina, apresenta-nos algo que eu designaria de “Roteiro Sentimental”, na medida em que os “caminhos” que persistem no seu imaginário são os que invariavelmente conduziram o seu expectante sentimentalismo aos cimos do Vale Trigo, ao velho caminho de Santa Bárbara, que findava numa das típicas ermidas que, na lira sublime de Guerra Junqueiro, são:

Como ninhos virgens d`orações piedosas, 
miradouros brancos de luar e rosas 
d`onde as almas simples entrevêem Deus. 

Para quem é tão sensível como a Dr.ª Cristina, as coisas simples têm um significado mais relevante do que para as pessoas comuns. Assim, para além dos bichinhos e das ervinhas pelos quais ela mostrara interesse em conhecer quando veraneava nas Mós, sendo criança ou adolescente, dezenas de anos depois, a mulher sensível, ao mesmo tempo que relembra coisas tão singelas como as atrás referidas, acaba por nos revelar que ficou muito impressionada com o ser humano mais simples que vive nas Mós: a deficiente Clarinda. E tão sensibilizada ficou, que acabou por lhe dedicar uma enternecedora crónica, que repetidamente publicou e agora está presente neste livro, entre as páginas 105 e 109.
A questão que o meu interlocutor só implicitamente me colocou tem a ver com um facto social que é o seguinte: a nossa prima Cristina não passou pela mesma socialização primária que nós passámos, ou seja, não foi submetida ao mesmo processo psicossocial, através do qual formámos a nossa personalidade de base, sobe a influência, primeiro, do ambiente rural e depois, do meio urbano, integrando-nos no conjunto de pessoas que poderemos designar de aculturadas.
A “aculturação” da prima Cristina foi incipiente. Nascida e criada na cidade do Porto, não viveu, portanto, no seio duma família rural, nem em contacto com companheiros de brincadeiras mosenses como nós vivemos e brincámos. Deste facto resultou a dificuldade que ela sentira em compreender o afinco que prendia o pai à terra que o vira nascer e crescer até aos 17 anos de idade. Não sabia que os liames que o prendiam às Mós eram os amores que deixou no ambiente campestre e amigo, que sendo muitos, são difíceis de enumerar: as cores do céu e das paisagens, a luz fresca da manhã, a música dos pássaros, os companheiros e os jogos de diversão… Enfim, uma inumerável quantidade de amores que cabiam na saudade de Adérito Quartas e que só o incomparável Trindade Coelho soube definir no livro “Os Meus Amores”.
Além do hierónimo Santa Bárbara, dois topónimos avultam também nas narrativas da Drª Cristina Quartas: Castelo e Vale Trigo. Importará saber porquê.
Três gerações de ascendentes seus conheci eu, habitando dezenas de anos no vetusto casario do Castelo, situado na base do alto de Santa Bárbara e a partir dos primeiros anos da década de 70, seu pai passou a veranear com o agregado familiar nos cimos do Vale de Trigo, na vertente do lado poente do monte de Santa Barbara. E foi neste sítio, desviado do casario da povoação, que a menina Cristina Quartas recolheu as impressões que produziram nela os efeitos suficientes para as transformar em narrativas como: “A Panela das Três Pernas, O Mistério da Noite e dos Prazeres da Alvorada, Momentos Majestosos e ainda, “A Caminho de Santa Bárbara” -1.ª e 2ª partes.
Além da riqueza do vocabulário, as crónicas de Cristina Quartas apresentam alguns apontamentos com apreciável interesse etnográfico e sociológico, mesmo sendo ela psicóloga por formação.
A partir de 2009, passou a visitar as Mós com alguma frequência, participando na Festa anual e noutros eventos que ali têm vindo a ser realizados. E regressando às raízes, terá começado a congeminar a produção deste livro, não só com co-autoria mas também muito influenciada pelo lirismo do grande poeta e seu amigo Professor Mário Anacleto, depois dela lhe dar a conhecer o seu repositório de recordações e reminiscências, a memorização dos olhares duma criança e duma adolescente citadina que estanciava nas Mós, sobretudo nos anos 70 do século passado. Com efeito, cerca de metade das suas crónicas e narrativas resultam do esforço da vontade sobre a memória e algumas delas apresentam um abraço da realidade com o sonho.
Depois de ter incutido no Poeta a simpatia pelas Mós e pelos seus cenários de presépio, conseguiu criar condições que o levaram a visitar a nossa aldeia. E então terá ficado incomensuravelmente apaixonado por ela. Enternecido, produziu mais de três dezenas de inspirados poemas, compilados no livro póstumo o “Trovador do Douro” e com os quais a Dr.ª Cristina (ao compilar o outro livro) ornamentou os seus textos, tal como fez com as lindíssimas e apropriadas fotografias que muito favorecem o conjunto. O Professor Mário Anacleto deixa transparecer no lirismo das suas estrofes, sentimentos sublimes, desejos e afectos incomensuráveis. Em ambos os livros ressaltam os poemas do grande poeta, musico e cantor, portanto um autêntico e grande Trovador. Pena é que tenha partido tão cedo!
Nos seus versos exprime os sentimentos da alma com um lirismo muito elevado, inspirado pelas Mós e pelos seus cenários de presépio, como atrás foi referido. Ficou apaixonado pelo que aqui viu e sentiu. Com muitos outros terá acontecido outro tanto, só com uma grande diferença: enquanto o Poeta verteu o seu deslumbramento nas suas belas estrofes, os outros tiveram que se resignar com a consagrada síntese de Santo Agostinho: “Sabemos o que é, mas não sabemos dizer como é”.

Tenho dito,
José Gomes Quadrado

Comments:
Um momento lindo... Obrigada primo José Gomes Quadrado!
Foi um orgulho muito grande tê-lo nesta minha apresentação como critico, comentador, apresentador deste livro que tanto significado tem para mim.
Obrigada pelas suas palavras e pela sua disponibilidade.
Foi uma bela apresentação, sem duvida alguma...
Um forte abraço
Maria Cristina Quartas
 
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